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Em pleno século XXI, no ano da graça de nosso Senhor 2022, ainda há tempo de antena e gigabytes dedicados a pseudo-oradores que dizem barbaridades do género "antes de o PHDA ter sido inventado" ou "epidemia de PHDA" entre outras belas pérolas oratórias. Ora, desdizendo a comunidade científica e médica de anos de experiência e de estudo, temos, portanto, aqueles que se insurgem contra uma suposta educação tradicional a favor de uma educação para o século XXI, negando ou troçando da neurodiversidade. Hoje PDHA, amanhã autismo, depois de amanhã depressão e no futuro mais próximo qualquer tipo de perturbação neurológica ou mental. Não percebo porque ainda se utiliza a velha e fracassada estratégia do insultar o que achamos errado para defender o que achamos certo. Ou seja e portanto, este "orador" insurge-se contra a educação que surgiu no período iluminista, que visava o ensino dos clássicos e foi restruturada no período da Revolução Industria para um mundo industrializado e capitalista, para defender a educação onde não se diz "não", onde se valoriza um currículo mais alternativo e se critica a estrutura, a rotina. Consigo entender tudo, a sério que sim e sem ironias.
Já dou aulas há 20 anos e nunca me iludi em relação ao ensino-aprendizagem: é uma via de dois sentidos - eu ensino mas os alunos também me ensinam, eles aprendem e eu também aprendo (com eles, com formação contínua, com mais estudos); é precisa uma base afetiva para uma aprendizagem bem-sucedida e duradora - a aprendizagem quer-se prazerosa, para ambos os veículos (o condutor e o recetor), quer-se emotiva, empática. Em suma e de forma extremamente simplista, a aprendizagem quer-se empática em várias frentes. Não é a negar ou a atacar a evolução da educação que incutiremos os valores éticos na educação para o século XXI. Eu acredito muito no envolvimento de todos os intervenientes e só assim sabemos que pode funcionar. Temos de gostar, de sentir a escola, a educação. Embora, eu também tenha a noção de que é extremamente difícil.
Não me perdi nesta minha divagação: eu não posso deixar de entrar na educação para e do século XXI a negar a neurodiversidade. Eu sou neurodiversa. E sou o outro lado da educação: fui aluna, sou aluna sempre que estudo, sou professora, sou aprendiz. E não sou neurotípica. Nem eu nem grande parte da população em idade escolar que será a mesma população em idade laboral e a mesma população em idade idosa, quando? Isso mesmo, no século XXI.
A Escola recebe todos. A Escola tenta dar respostas. Mas não esqueçamos nunca de que, quem faz a Escola, são as pessoas. As pessoas certas, com o coração e o cérebro nos locais certos, fazem a diferença e são a diferença.
Assumamos que há a diferença, que há a deficiência e que nenhuma vida é inferior a qualquer outra. Assumamos que todos podemos contribuir para a evolução e assim sim, conseguir caminhar e entrar na tal educação do século XXI, na tal Escola universal e inclusiva.
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A Rita é mãe atípica. O Lucas tem autismo e tem toda uma equipa fantástica que o acompanha. Nesta caminhada, a mãe pretende chegar mais longe e, além de desmistificar um pouco no que consiste esta sigla PEA (Perturbação do Espectro do Autismo), mostrar que o seu Lucas, tal como tantas outras crianças, no espectro ou não, pode ser feliz e valoriza e descobre tantas outras coisas a que muito poucos dão importância.
O livro está muito bem conseguido e aposta num formato multiusos, ou multiformato, para se poder chegar a todos quanto possível. Há ilustrações deliciosas, há verso, há palavras-chave, há ensinamentos, há diversidade - neurodiversidade.
Recomendo.
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Porque hoje é abril - o que se espera fazer num mês com repercussões durante todo um ano e impacto positivo durante uma vida. Porque hoje é 2 de abril, dia mundial da consciencialização do autismo.
Porque hoje, a piolha Ester escreveu este texto, na 1º pessoa, a falar de si como oradora na apresentação do livro Lucas e o autismo . Porque foi o primeiro de muitos discursos que certamente surgirão.
" “Am I good enough? Yes, I am”- Michelle Obama
Sim, eu concordo com ela. Nós devíamos gostar de nós mesmos e não dar importância aos outros querem que nós sejamos. Por exemplo, os outros querem que eu seja mais como eles, mas não percebo porquê se eu gosto de ser como sou- autista ou não.
Mas quando alguém quer que eu seja uma pessoa diferente do que eu sou, não significa que eu tenha de mudar quem eu sou.
Só porque pensamos duma maneira diferente, não significa que somos deficientes ou incapaz. Uns são mais rápidos, outros preferem falar, outros pensam em imagens, outros até precisam de imagens para comunicar.
Somos todos iguais em direitos, quem disse que éramos diferentes? Somos também todos diferentes, quem disse que isso era errado. Por que temos de falar disto, se tudo isto é normal?"
O texto da apresentação do livro da piolha Beatriz. Foi um tão texto pessoal, tão emotivo que arrancou umas lágrimas e muitos aplausos da audiência.
Estou tão orgulhosa das minhas meninas. Tão mesmo.
"O autismo, não me define, nem a mim nem à minha irmã.
Sim, eu tenho autismo, e mesmo com dificuldades consigo fazer muitas coisas. Há muitas coisas que os meus colegas fazem que não percebo ou tenho dificuldades com algumas palavras, mas há coisas em que sou muito boa, como desenhar ou fazer vídeos. Mas, às vezes, eu ouço pessoas a usarem a palavra “Autismo” como um insulto. Eu fico ofendida, às vezes eu ignoro, às vezes respondo “Isso não faz sentido!”. Quando são adultos a usar esta palavras, os pais reagem contactando diretamente essas pessoas. Quando são os meus colegas a insultar-nos, eu fico mesmo triste. Não sou mais nem menos do que qualquer outro jovem, apenas tenho um cérebro com ligações diferentes. Não estão erradas, estão é diferentes. Mas, é aquilo que me fez única e não igual a outra pessoa. Além disso, eu sinto como qualquer outra pessoa sente.
Vou repetir, o autismo não me define, eu tenho muitas capacidades e eu sei que consigo, já mostrei que consigo, não vou deixar que uma palavra tenha um poder que não deve ter.
Eu sou autista, mas sou capaz. E, antes de tudo, sou a Beatriz."
Um exemplo real em como não se deve julgar um livro pela capa - nem pelo título. A capa e o livro não deixam antever como ele é bom. É um livro excelente e de uma leitura rica, interessante, com pinceladas históricas da década de 40 do século XX, que não conseguimos pousar de ânimo leve porque apetece continuar a ler. E tem um plot twist incrível.
A história saltita entre os anos 1940s e 2011. Laurel pretende descobrir um segredo (ou segredos...) que a mãe guarda para que possa, agora que já está nos 50s e a mãe à beira da morte, finalmente perceber porque ela, a sua mãe tão boa, tão doce, tão cuidadosa, tão meiga, matou um homem com a faca dos bolos, aquela faca especial. Laurel tinha 14 anos mas nunca esqueceu o que viu embora também nunca tenha culpado a mãe...
Viajamos. Este livro faz-nos viajar dentro da Londres em escombros e da Londres moderna; dentro das casas senhoriais protegidas com fita adesiva nos vidros e sujeitas a requisição civil onde funcionavam os serviços de comunicações do Governo no passado e das ruas cheias de turistas e das universidades com bibliotecas imensas onde não faltam entusiastas no presente; da mãe de Laurel, jovem, e da mãe de Laurel, idosa. É um livro que recomendo muito. Gostei mesmo bastante.
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