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Quem passou pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra nos finais dos anos 90 e inícios dos 00s nos cursos de Línguas e Literaturas Modernas com as várias variantes de estudos, apanhou, de certezinha absoluta, aqueles "professores" que guardavam a nota 20 para si mesmos e jamais avaliavam acima do 15, dizendo que este era o seu 20. Eu tive, na realidade, 10s que souberam a 20s, portanto, nada, naquela altura me espantava - a não ser a tremenda injustiça que grassava por lá. Tolerância nenhuma, inclusão pouca... outros tempos, não é verdade?
Por isso, volvidos quase os equivalentes aos anos das bodas de prata, quando algum tenrinho (como, carinhosamente chamo, à geração seguinte - sem ironias, ok?) me diz que adora a faculdade que delira com as aulas, que as notas são maravilhosas, eu, sinceramente, sinto que falamos de outro local.
A minha geração sofreu horrores naquelas salas e corredores. E sim Coimbra, teve mais encanto na hora da despedida. Fiquei muito desiludida, dececionada e magoada com a FLUC. Havia excelentes professores, não duvidemos, mas eram uma percentagem quase mínima... E poucos tinham vagas...
A minha nota mais alta, na FLUC, foi um 15 - o tal equivalente a um 20. Nem queria acreditar que seria possível. Mas chumbei 3 ou 4 vezes, à mesma disciplina, com 9. Sempre com 9. Definitivamente, Psicologia Educacional não era para mim. E chumbar sempre com 9 foi marranço puro da docente para comigo. Quando repeti a disciplina - com outro professor -, terminei com 15, mas adiante.
Consegui, no presente ano letivo, pela primeira vez, na FLUC, uma nota acima dos 15, justa e verdadeira. E sabe muito bem. É coerente, é real.
Tenho feito as pazes com o meu passado naquela instituição. Não tive sorte com a minha década de estudo nem com a escolha de alguns professores (eu ainda sou do tempo das noites dos horários e, estando aquele horário pretendido cheio, lá íamos nós para as opções seguintes... Desgraçado de quem chegasse na 2ª fase. Como eu...). Hoje a FLUC é uma instituição inclusiva, onde estudam pessoas com deficiências visíveis e invisíveis (há vários autistas ingressados num curso superior); adaptada à realidade do dia a dia e não presa num conservadorismo inexplicável; com um gabinete de apoio ao estudante e uma vontade de alargar a experiência universitária a todos. Hoje, a FLUC é a faculdade que eu desejava ter frequentado no final da década de 90; hoje a FLUC é a faculdade com que sonhei em adolescente; hoje é bom estar de volta à FLUC. Hoje, gostaria de apagar aqueles traumas, bullying puro de alguns docentes que já lá não estão (e ainda bem): a vergonha do meu nome ou da minha nacionalidade (eu que sou portuguesa sentia vergonha de não ser tratada da mesma forma que eram os meus colegas estrangeiros), de ter mais aptidão para uma área do que outra, do ser gozada por adorar estar num instituto de volta de livros ou trabalhos, do chorar desalmadamente na casa de banho, do quão difícil era conseguir estar à altura das expectativas de alguns docentes (nunca estava), da humilhação gratuita que nos faziam quando errávamos algo ou não tínhamos o mísero 10 ou de ainda hoje sonhar que me falta fazer uma disciplina para terminar o curso ou pagar a última prestação das propinas. Não me venham cá com mitos de que estudar por lá foi tudo rainbows and butterflies porque não acredito. Cruzei com dezenas de colegas assim. E, quando anos depois, nos encontramos por lá para fazer formação, todos falam disto. Não sou a única...
Hoje, estou feliz por estar na FLUC. Hoje gosto de ser alumni, de ser estudante na Universidade de Coimbra. Hoje sim, sinto-me integrada, incluída, respeitada e ensinada com pedagogia e respeito. Hoje, a FLUC é a "minha" FLUC. E é bom melhorar o passado e vivê-lo com carinho no presente. E eu estou feliz com a minha nota :D
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O autismo não se cura com medicação. Nem se trata com medicação. Não há medicação específica para a causa do autismo pois nem se conhece bem a sua causa - mas sim, para alguns sintomas, como hiperatividade, agitação motora, parassónias, desregulação intestinal, etc.
A PHDA não se cura com medicação. Há terapêutica medicamentosa mas é temporária e, metaforicamente falando, é como sair de um nevoeiro para um dia nublado. Atua, é relativamente eficaz mas não cura.
A epilepsia não se cura com medicação. Ou cirurgia. Ou outra técnica clínica cerebral qualquer invasiva. Mas também tem terapêutica medicamentosa para regular, controlar e até estabilizar crises.
A cegueira não se cura com medicação. Nem a surdez se cura com medicação. Nem a esclerose múltipla se cura com medicação. Nem o síndroma de Down se cura com medicação. Ou o síndroma de Rett se cura com medicação.
Há uma enorme pressão sobre os pais de crianças com estas perturbações/síndromes para que resolvam as questões comportamentais, neurológicas, cognitivas, sociais dos seus filhos, como se, estes pais tivessem a capacidade milagrosa de criar um comprimido ou xarope mágico para curá-los e transformá-los em crianças típicas, "normais", daquelas que seguem todas as caixinhas nas checklists de desenvolvimento e que não perturbam o normal funcionamento de uma aula, sem crises, sem medicação SOS e sem ter de se chamar o INEM dia sim dia não.
A escola (não falo da minha ou da vossa, mas da instituição), por vezes, tende a esquecer-se do seu papel e estende-se a uma vertente clínica e farmacêutica que não lhe compete. Eu já perdi a conta às vezes em que me pediram/insinuaram/perguntaram por medicação para as piolhas. Acredito sim em medicação que traga qualidade de vida e nos ajude (eu tomo paroxetina há quase 2 anos e as piolhas já tomaram risperidona na infância) mas a medicação não faz milagres nem cura a maioria dos problemas que a escola quer resolver. Aliás, salvo algumas doenças ou indicações médicas (m-é-d-i-c-a-s) a questão da medicação é temporária.
Acho que cada macaco no seu galho: nem a escola se imiscui nas questões clínicas nem o hospital se imiscui nas questões pedagógicas. Ambos devem, no entanto, complementar-se e trabalhar com o objetivo comum de cuidar da criança/jovem e proporcionar-lhe os seus direitos. É o tal trabalho de equipa em que se valorizam e aproveitam as valências de cada membro diferente entre si para se chegar a um resultado único, comum e final.
A escola devia ser a primeira a acreditar que se os pais pudessem dariam anos de vida ou trocariam de lugar com os filhos. A questão da medicação é somente um grão de areia na imensidão de questões que precisam de ser avaliadas, tratadas, resolvidas, cumpridas.
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Uma criança autista será um jovem autista que será um adulto autista. No percurso, poderão estar (ou não) reforços, trabalhos, terapias, acompanhamentos, etc. E um diagnóstico fechado, preferencialmente, escrito preto no branco e, onde, à luz da legislação nacional, se leia “deficiência neurológica”. Ou outra.
Porquê?
Porque, da mesma forma que temos medidas de promoção do sucesso em contexto de aprendizagem escolar que podem ser (e devem, se for caso disso), aplicadas, também temos o seu equivalente no mundo laboral. Para já, ainda não é uma questão sobre a qual eu me debruce muito, mas começo já a ter a noção do que podemos vir a esperar.
Independentemente de haver ou não uma deficiência, há a questão do direito ao trabalho. E do desejo de querer trabalhar. Nada de errado nisso, é até muito louvável, tendo em conta a quantidade de jovens nem-nem (nem estudam nem trabalham) que temos em Portugal. Há, igualmente, a questão do querer ser considerado e tido como igual aos demais na candidatura ou admissão ao lugar a que se concorre. O facto de haver o direito de se considerar uma percentagem obrigatória por lei para pessoas com deficiência – a tal “quota” -, não implica que se usufrua desse direito. Ou, e muita atenção a isto, esteja a ocupar um lugar de outrem. Eu sei que tenho direito a concorrer a nível nacional mas, por opção, não o faço. E, ao fazê-lo ou ao não o fazer, não estou a roubar o lugar a ninguém. Faço-me entender?
Portanto, para que se clarifique um pouco a noção da “quota” ou do trabalhar, mesmo tendo uma deficiência: tal como se faz nas escolas, o que se deve fazer no local de trabalho é ter em conta algumas acomodações para a PcD (Pessoa com Deficiência), por exemplo, uma rampa, um elevador ou um local de trabalho ergonómico ou luzes de baixa intensidade ou uma área reservada para trabalho ou pausas para refeições em cantinas em horários desfasados ou possibilidade de usar abafadores de som ou esquemas visuais etc. Claro que, tal como nas escolas, para que seja mais eficaz tratar desses recursos, é preciso haver um diagnóstico, preto no branco, ou um certificado multiusos que ateste a deficiência. Uma PcD não é incapaz de pertencer ao mundo laboral só porque tem uma deficiência. Mas, precisa – ou pode precisar – de adaptações necessárias para ser tão – ou mais – produtiva que os seus pares (neuro)típicos.
O que considero ser mais justo – utópico, talvez? Espero que não… - é um maior entendimento da questão. Se um autista vai trabalhar e precisa de acomodações necessárias, por que não? Muitas vezes, nem sequer precisa de haver um investimento financeiro, basta alguma boa vontade pois a estruturação, a familiarização com o espaço (e o que é preciso fazer), o estabelecimento de uma rotina ou outros, já serão por conta do funcionário/empregado/colaborador (whatever que está na moda dizer-se agora). Há uma relação estreita entre trabalho-produtividade-ambiente. Ninguém é produtivo num ambiente desajustado. E, sob pena de se perder um excelente profissional, não atentando nesse grande pormenor, perde-se mais do que se ganha.
Deixo apenas uma reflexão em jeitos de conclusão sobre o direito e o desejo do trabalho: o meu professor de LGP é surdo profundo. E é professor e advogado. E ativista. E é um excelente professor e foi graças a ele que temos hoje, na grande maioria dos canais de TV, os intérpretes de LGP no canto da TV, no rodapé. Se concorreu à quotização de trabalhos ou não, não sei nem me interessa. Mas trabalha. E lutou pelas suas acomodações. E é um grande profissional.
É isto que eu quero para as minhas filhas. Porque, podendo ou não usufruir de tal, é um direito que lhes assiste.
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Agora aos 40s, a nossa intuição e experiência são outras. Também é outra a nossa força de vontade e a certeza de que não nos comerão as papas na cabeça. Somos capazes de pesquisar e estudar sobre assuntos em nada relacionados com as nossas áreas iniciais de formação e de recorrer a vários especialistas sem pudores ou receios.
Em julho, soubemos que as piolhas têm escoliose. Uma em grau severo (42º), outra em grau ligeiro (12º). Desde o dia em que notámos uma diferença na zona pélvica que temos andado incansáveis em busca de soluções - e sim, aqui podemos usar o termo, uma cura. De um especialista em ortopedia infantil passámos a um ortopedista geral e depois a peritos externos ortopedistas em coluna e escoliose. Nunca nos deixámos ficar pelas respostas vagas ou pela incerteza dos atos a seguir ou do resultado final. A Tânia, do O Mundo do Gonçalinho , foi paciente e proporcionou-nos, além dos seus conhecimentos, uma opinião clínica fundamentada que, em última instância, acabou por bater certo com tudo o que avaliámos até ao momento.
A escoliose delas é a escoliose idiopática típica do adolescente, sem causa genética e que acontece de forma relativamente rápida. As curvaturas da coluna vertebral tendem a ser na zona superior mas há também na zona lombar, como é o nosso caso. Existem vários protocolos de ação e de consideração da severidade bem como de diagnóstico: raio x, obviamente, com recurso à medição do ângulo de Cobber (para dar o grau de curvatura), teste de Adams, verificação do sinal de Risser e avaliação física. Dependendo do grau, pode ser necessário avançar para fisioterapia especializada, desportos específicos, uso de coletes corretores ou cirurgia. O uso do colete está sempre dependente da ossificação da ilíaca - sinal de Risser -, ou seja, da maturidade óssea que se verifica na ilíaca. Se estiver no grau 5, a maturidade óssea está concluída, logo, não se equaciona sequer o uso de ortopróteses.
Portanto, a causa da rapidez de ganho dos nossos cabelos e barba brancos: ossificação da ilíaca completa (e piolhas mais baixas que a mãe, ao contrário do que se supunha), uso de qualquer tipo de colete completamente posto de parte, cirurgia em cima da mesa (apenas adiada; sabemos que será necessária uma intervenção cirúrgica, mais tarde ou mais cedo), fisioterapia desnecessária e aposta em desportos que corrijam a postura e impeçam a evolução da escoliose (como natação, remo, puxar pesos apropriados até aos ombros, ioga). Não somos geneticamente culpados deste desaire clínico e, ao contrário do que nos foi dito, também não somos culpados de não termos visto mais cedo que havia um desnível pélvico. Não há absolutamente mais nada que fizesse prever uma situação destas (alturas diferentes de pernas ou desnível de ombros ou dor, etc.) e, mesmo que tivéssemos agido no momento em que vimos uma diferença mínima, já seria tarde e o desfecho cirúrgico seria o mesmo porque a ossificação da ilíaca já estava concluída.
Temos as respostas de que precisávamos e recorremos a vários especialistas (incluindo no estrangeiro) para isso, as piolhas foram sempre decisoras e parte integrante do processo, não nos limitámos a um "agora é aguardar e daqui a seis meses vemos de novo".
Cá estaremos para ultrapassar mais este desafio e este texto foi escrito com o aval delas "porque podemos ajudar outras pessoas a tomar atenção às costas e a procurar respostas" (citação delas).Também cá estaremos para gerir tudo o que seja necessário. Ainda assim, daria tudo para trocar de lugar com elas. Porque a minha veia control freak sabe o que fazer... Com os filhos, a minha veia control freak tem zero poder.
A intuição existe e é importante. E o conhecimento também. Não somos menos por questionarmos ou por querermos respostas dignas e completas.
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Spoiler alert: Não tem nada a ver nem com autismo nem com Covid-19
Voltamos à personagem principal, o médico legista com laivos de investigador forense, Jack Stappleton e a sua esposa (agora diretora do OCME, o Instituto de Medicina Legal de Nova Iorque) que, recentemente recebem o diagnóstico de autismo da sua filha Emma, de três anos e não sabem bem como gerir tudo isso, em especial depois de passarem por algo já tenebroso com o filho mais velho. Infelizmente, o autismo não tem cura e eles aprenderão a lidar com isso. Há referências breves ao estudo muito desacreditado de que autismo é causado por vacinas e que há terapias milagrosas e explica-se sucintamente a possibilidade genética e/ou epigenética do autismo.
Neste turbilhão, ocorrem mortes surpreendentes no metro e, mais tarde, algures em vários países da Europa. Pensa-se numa pneumonia citogénica, semelhante à da epidemia de 1918 e teme-se que o mundo esteja à beira de uma nova pandemia... Acabamos envolvidos numa rede poderosíssima de transplantes de órgãos onde a genética desempenha um papel crucial e onde, mais uma vez, a ética é varrida para debaixo do tapete em busca de mais dinheiro, mais glória, mais respostas rápidas - se possível, contornando a legislação e protocolos legais. E é "a brincar" com a genética que se fazem sabotagens virais sem se pensar ou antecipar consequências... O futuro? Quiçá bem mais próximo do que pensamos (ou antecipamos).
Robin Cook, médico e escritor, publicou "Pandemia" em 2018, sem imaginar que, um ano depois, o mundo entraria em lockdown e o cenário seria bem pior do que o imaginado no livro.
Nota: li em formato edição de bolso porque é leve, prático e, acima de tudo, bem mais barato.
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