Para as piolhas - e, para nós, em acréscimo - o dia começou às 6:56 e saímos de casa às 7h58 (assim, com este rigor e tudo) para a consulta de autismo no centro de neurodesenvolvimento do Hospital Pediátrico de Coimbra, onde começámos pouco depois das 9h e saímos pelas 11h (o meu rigor de horas perdeu-se, nos entretantos, mas as piolhas fixaram tudo).
Quem viu as piolhas há uns anos nunca poderia imaginar como estariam hoje... Pareciam outras crianças, nunca pensei - nunca acreditei - que o que alguns médicos e enfermeiros nos diziam fosse possível. Diziam-nos que, dali por uns anos elas conseguiriam vir às consultas sem que nos preocupássemos com o seu comportamento e que os meltdowns iriam passar... Que conseguiríamos sair. Fico tão feliz por saber e sentir que foi e é possível sim.
Pesagens, medições e até a tensão arterial deixaram medir, sem sequer questionar. Pelo meio, ficam as preocupações prementes a registar: a área social que é fraca e a linguagem que, apesar de erudtia, é limitativa. Não precisamos de Relações Públicas em casa mas vê-las sozinhas na escola, nos intervalos, a passear de um lado para o outro, não nos deixa propriamente felizes e descansados.
Conversámos com o médico imenso tempo. Ele consegue, de alguma forma, acalmar a nossa ansiedade e responder às nossas dúvidas. E apercebermo-nos, mais uma vez, que ainda há muito a fazer e que fazia mesmo muita falta um bom livro de instruções para educar e criar uma criança com a adenda relacionada com o espectro do autismo.
Almoçámos fora, apanhámos a avó ali perto e viemos para casa.
Já estudámos para Ed. Musical e Ciências da Natureza, com a ajuda da mãe (a mãe a ditar e as piolhas a escreverem resumos da matéria, a fazer exercícios dos livros de atividades e exemplos de testes). As mochilas para amanhã já estão prontas.
Às 16h40, as piolhas estão a ver TV.
Pelo meio, apesar de ter avisado que iria faltar (meter o dia, na verdade, daquelas alturas em que é preciso entregar formulário na Seg Social e tudo), ainda recebo telefonemas da escola - que não atendi (nao ouvi e não retornei. Nestes dias não sou bem eu... precisava de uns dias para assimilar tanta coisa e não ter que me preocupar com nada, mesmo nada).
Não sei explicar ao certo a fase em que nos encontramos, apesar de um balanço positivo. Mas, aos 10 anos, com quase 1,40 m, as piolhas já destoam em muitas situações sociais e acabamos por nos apercebermos das suas dificuldades. Elas até podem não entender - ainda - muito bem mas nós vivemo-las de perto e doi muito. Lá chegaremos onde também chegam os outros mas é um desbravar de caminho extremamente cansativo porque não há ali nenhuma clareira...
Ainda não foi desta que o meu lado estupidamente irracional vê o seu desejo mais profundo concretizado numa consulta: uma inovadora e fantástica e infalível e incrível forma de minimizar ao máximo as consequências do autismo. Eu sei que é parvoice. Mas não consigo impedir de o pensar, involuntariamente.
São 17h10, as piolhas estão a brincar com as suas Barbies, com a TV apenas ligada porque sim. São miúdas felizes e fáceis de contentar. O mais importante ainda é isso.
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