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Não sou um saco de pancada

por t2para4, em 20.10.22

As aulas começaram há um mês e uns dias. Estamos em meados de outubro e já li tantas tantas tantas notícias sobre agressões a professores que começo a perder-lhes a conta.
Eu não sou um saco de pancada.
Eu não sou o bode expiatório de ninguém.
Eu não um poço de descarga de frustrações alheias.
Eu não sou a culpada desta sociedade doente.
Eu não sou a super mulher.
Eu não sou mãe de centenas de alunos.
Eu não sou um saco de pancada.
Não sou nem tenho feitio para isso. Não admito a ninguém que me levantem a mão. Ou me ameacem. Ou me danifiquem propriedade. Eu dou muito de mim, todos os dias, todas as horas ao meu público presente mas jamais admiti ou admitirei faltas de educação, faltas de respeito ou ameaças tentadas ou concretizadas.
E não me venham com os blá blá blás do costume "ai só foste para professor porque quiseste" e "tu é que escolheste". Já falaram assim de um médico? Ou engenheiro? Ou advogado? Pois é. Critica-se o professor porque ganha bem (ahahahhahahaahahhahahahhahaha), tem 3 meses de férias (um dia, trocamos. Troco os meus 3 meses de férias por 1 mês de férias em época baixa), não trabalha (ahahahhahahahahah, vamoláaver: ontem tive 2 reuniões online e uma terminou às 20h; há conselhos de turma a serem marcados aos sábados; as secretarias cada vez empurram mais trabalho administrativo para professores, etc e tal), as editoras até dão prémios (ahahahhahahaah se derem uma pen que funcione com o livro interativo, já é uma sorte), não gastamos o nosso dinheiro em material (um dia, hão de falar com o meu marido. Ele vos dirá como eu faço com o material para a escola. E quanto gasto.) e mais um par de botas.
Eu não quero levar no focinho.
Eu não sou saco de pancada de ninguém, nem miúdos nem graúdos, nem sozinhos, nem em manadas.
Se não se desrespeitasse a classe docente (muitas vezes, a começar pelos próprios professores. Sim!!! Já este ano fui acusada de ser demasiado nova e não saber o que era a vida por um "colega", pouco mais velho que eu); se o Governo, em vez de fazer disparates atrás de disparates a querer ganhar opiniões públicas ignorantes e a querer fazer da escola um verdadeiro colégio interno público grátis e a desvalorizar as habilitações para a docência, governasse como deve ser e trouxesse de volta o respeito perdido, talvez, talvez, não se ousasse levantar a mão contra um professor ou injuriar um professor. Não precisamos de voltar ao tempo da "senhora professora" quase tão sagrada como o padre mas eu cá gosto muito de respeito pela minha pessoa, pela minha profissão e pelo que faço.
Eu não sou saco de pancada. Nem eu nem nenhum professor.
E escusam de vir com outros blá blá blás de "ai mas os professores também abusam". Certo. E para os abusadores existem mecanismos de contenção e de apuramento de responsabildades, ou não? Os médicos não abusam, são sempre certinhos, acertam nos diagnósticos todos, são todos muito humanos e maravilhosos, é isso? E os advogados também ganham sempre as causas todas e vão acabar com os crimes de pedofilia e violência doméstica em Portugal. E os engenheiros aeronáuticos vão colocar um satélite português em Júpiter só para rivalizar com a NASA. Ai não? Não é assim? Mas devia. Se eu tenho que fazer papel de progenitor na escola, de ser enfermeira e auxiliar, por que o médico não o faz também? Ou o engenheiro? Ou o farmacêutico? Não pode? Mas podem ser professores, não é? Ai isso, já podem? Ah, está bem. Mas têm habilitação para a docência? hã... o Governo diz que há uns créditos. Ok, e fizeram disciplinas educacionais ou estágios ou deram aulas assistidas avaliadas? Não? Mas podem ser professores... Eu sou mãe de duas meninas autistas. Posso ser médica do neurodesenvolvimento e autismo? Não? Mas porquê?? Tenho tantas formações e até tirei 3 cursos pela Universidade de Genebra! Não posso? Que coisa... Mas o neuropediatra pode ser professor (se estiver louco e desesperado, claro)? Está bem, então.
Minha gente. Eu não levo pancada. E, se, eventualmente, isso acontecer, ou eu estarei outra pessoa ou algo de muito grave e sério se passará a seguir.
Eu quero e exijo respeito. Podem não gostar de mim, mas têm de me respeitar. E com isso acresce a minha escolha profissional. Porque, no dia - e asseguro que falta muito muito pouco - em que todos os professores se fartarem de apanhar e desistirem, deixará de haver educação. E aí entraremos naquelas distopias orwellianas e o poder estabelecido rejubilará porque um povo burro é um povo controlado e obediente. Só não quero é as minhas filhas metidas nessa carneirada.

 

 

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publicado às 13:50

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7 comentários

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De marina malheiro a 18.11.2022 às 07:53

Bravo!
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De Maria Araújo a 18.11.2022 às 13:27

"as secretarias cada vez empurram mais trabalho administrativo para professores, etc e tal),"



Há anos que comento isso.
Não comento mais nada porque estou 500% de acordo.
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De t2para4 a 22.11.2022 às 10:47

É um problema que vem de trás e começa a ser cada vez maior...
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De Jóe José Dias a 18.11.2022 às 16:30

Acontece também em Portugal? E com essa frequência? Estou impressionado. Bem, não deveria, a julgar pela deterioração de nossos direitos mundo...
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De t2para4 a 22.11.2022 às 10:46

Obrigada pela sua partilha tão bem estruturada e documentada.
Creio que, neste momento, é um comportamento algo vigente em vários países (nem falo dos EUA onde o sistema é um pouco semelhante ao nosso)... Não sei para onde caminhamos... Para já agradeço estar num cantinho de céu em questões de (in)disciplina. Mas assusta-me o futuro.
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De s o s a 18.11.2022 às 21:01

o post é humano e como tal considerado.


Mas só pode estar a exagerar, faz um retrato alarmista e negro, e ainda por cima mistura  balas politico-filosoficas que em nada ajudam a establizaçao de a cesar o que é de cesar. 


O direito que reclama assiste-lhe automaticamente. 
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De t2para4 a 22.11.2022 às 10:44

Sim, é um post humano mas não é negro nem alarmista - é real. Veja as notícias mais recentes e as estatísticas de agressões a professores por parte de alunos e/ou encarregados de educação... Também há o verso, é certo, mas incomoda-me muito esta falta de respeito pelo outro. 
Em Portugal, ser professor hoje é desprestigiante e não é nem bem pago nem respeitado. Ou se gosta do que se faz ou não se consegue aguentar.

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