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Demorei anos a aceitar-me como sou, foi um percurso que demorou os meus quase 40 anos.
Durante muitos anos, em especial na adolescência, não tirava fotos a sorrir porque o queixo era comprido, os caninos acentuados e parecia um vampiro.
Durante muitos anos, esforçava-me ao máximo por esticar o cabelo (o que era, afinal, contraproducente) porque todos tinham cabelos esticadinhos e bonitos e o meu era tão rebelde que quase tinha vida própria e impulsos assassinos.
Durante muitos anos, tentei imitar estilos de atrizes da moda a ver se também me ficavam bem e deixava de ser tão gozada.
Durante muitos anos, deixei de usar saltos altos porque todos eram mais baixos que eu.
Durante muitos anos, já casada e mãe, desisti(ra) de usar calções, saias, vestidos porque a celulite pusera-me as pernas feias. Usar bikini era uma exceção pois não me sentia tão mal no mundo real com outros corpos reais por perto.
Em quase todas estas situações houve gozo, bocas foleiras, humilhação, body shaming. Ou era alta demais ou magra demais ou comprida demais ou "com corpo bem feito mas nada gira de cara" ou "bonitinha mas demasiado magra" ou "fazia-te bem mais uns kg" (algo que ainda hoje ouço) ou "isso já é celulite" ou mais uma data de merdas sem nexo e sem jeiteira nenhuma.
Não quero isto para as minhas filhas. Elas são lindas, magras, altas, morenas, etc ao jeito delas. E são como são e não há mais nada a fazer.
Demorei demasiado tempo a aceitar que o meu corpo é resultado de uma vida vivida, de batalhas travadas, de conquistas feitas. O meu corpo não é de plástico, não sou um manequim de loja, não sou nem quero ser perfeita.
Não quero ceder nem voltar a ceder a pressões sociais. Não tenciono limar os dentes caninos nem fazer cirurgias plásticas, não tenciono pintar os meus brancos (cada vez em maior quantidade), não tenciono fazer cenas estranhas para acabar com a celulite (que mito tão grande...), não tenciono esfalfar-me num qualquer ginásio x/h/dia para culto do corpo - sou demasiado preguiçosa e estou demasiado cansada para isso e não vejo objetivo nisso.
Sou como sou, alta, magra, com rugas de expressão cada vez mais vincadas, com pernas com celulite, uma barriga a mostrar alguma flacidez (em especial ao final do dia), um cabelo rebelde que não gosta de ser penteado, os meus característicos dentes de vampiro e um queixo comprido. Sou assim e mais nada, quem não gosta põe no bordo do prato.
Abracei vestidos, calções, saias, fatos de banho. Mostro a perna e ainda ponho pulseiras nos pés. Uso batons vermelhos/castanhos/roxos/púrpura escura. Não penteio o cabelo. Fiz mais furos nas orelhas. Uso calções justinhos por baixo de saias e vestidos para as pernas não roçarem uma na outra. Uso saias de escritório com sapatilhas e calções com sandálias. E ainda pinto as unhas dos pés a combinar com as das mãos. E até uso calças curtas com botins, se me apetecer, e leggings com DocMartens. Não saio de casa sem lápis nos olhos e usei sempre baton no ensino à distância. Detesto caras cheias de betume em que tudo é igual a tudo e demasiado artificial.
Não pretendo agradar a mais ninguém a não ser a mim mesma e esquecer que, um dia, cedi ao body shaming e às pressões do "não uses", "não faças". Não quero que as piolhas sintam vergonha de si mesmas e peçam para serem diferentes do que são - como eu o fazia. Porque nada disto, absolutamente NADA disto é natural.
Como é que dizia o anúncio: "Se eu não gostar de mim, quem gostará?". Autoestima é importante, os outros não. As opiniões destrutivas e discriminativas não dão ordenado nem tempo de serviço.
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