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Começámos as nossas aventuras no mundo da terapia da fala em novembro de 2010.
Confesso que, na altura, os meus conhecimentos em relação a esta área eram muito limitados e, inocente e pateticamente, eu achava que o terapeuta ia ensinar as piolhas a falar num instante. Imaginem a minha perplexidade e confusão quando a maioria das sessões – paga por nós, sem qualquer apoio – se baseava em brincadeira pura. E, meus amigos, só vos posso dizer que ainda bem que assim foi. Esta foi a base, a plataforma de segurança, a catapulta para o sucesso. O lúdico é extremamente importante e pode ser associado a tudo, absolutamente tudo.

Na altura, recomendaram-nos um excelente terapeuta, o melhor da região e nem pensámos duas vezes. A forma como tratava as piolhas e falava connosco, o modo como nos explicava e ensinava as coisas, as suas abordagens foram imprescindíveis para que tudo corresse bem e, de facto, tenhamos tido a evolução que tivemos, não tenho qualquer dúvida.
Não sou muito entendida nas diferentes e variadas abordagens existentes mas posso, com segurança, falar do que usámos (e ainda usamos) por cá. Não usámos ABA – embora eu tenha que convir que, de facto, para ensino de comportamentos imediatos e a longo prazo, é algo extremamente útil, mas, como pretendíamos algo mais voltado para o comportamento adaptativo, achámos esta metodologia algo limitativa para nós -, tivemos um mix de Método TEACCH e Método DIR/Floortime. Foi o que melhor se adequou à nossa realidade, não quer dizer que possa ser o ideal para outros casos - lembremo-nos que cada caso é um caso e o espectro é variadíssimo.
Muito sucintamente, o Método DIR assenta numa abordagem relacional, centrada no eu. O D.I.R.®/ Floortime™ baseia-se no Desenvolvimento Funcional da criança, diferenças Individuais e Relacionamentos, tendo como objetivo a formação dos alicerces para as competências sociais, emocionais e intelectuais das crianças, em vez do foco em comportamentos isolados. Um associado ao outro, é um modelo de intervenção intensiva e global, que associa a abordagem Floortime ao envolvimento e participação da família (devido à importância da sua relação emocional com a criança), às diferentes especialidades terapêuticas que trabalham e articulam como equipa, incluindo aqui as competências a adquirir a nível académico. E, já que estamos neste campo, pode entrar, então, o método TEACCH que consiste na adaptação do ambiente para facilitar a compreensão da criança em relação ao espaço e trabalho esperado, visando uma maior autonomia mas com pontual auxílio do professor para novas aprendizagens, promovendo a comunicação e interação social.
Reforço que apenas deixo aqui conceitos e objetivos muito muito gerais. Cada profissional, cada pai escolhe o que melhor se adapta à sua realidade e caso. Estas foram as nossas experiências, não tenciono impor nada a ninguém.
Há coisa de 2 semanas, estive numa palestra em Coimbra, promovida pela TIS - Technological and Intelligent Systems, com o dr. Jake Greenspan. Pelo apelido, já dá para perceber do que se trata. Foi bastante interessante ouvi-lo falar da sua experiência – além de que ele também foi professor de matemática – e rever todas aquelas coisas que eu já tinha aprendido, feito e até traduzido para ações de formação realizadas noutros locais. O mais interessante é a forma como se trata a comunicação: por círculos que se vão abrindo e fechando, consoante o nosso “crescimento” na árvore do desenvolvimento (os objetivos a alcançar) e que constam no seguinte:
1ª Fase (ou círculo): Autorregulação e Atenção compartilhada – Interesse no mundo
2ª Fase: Envolvimento e Relacionamento
3ª Fase: Comunicação recíproca intencional
4ª Fase: Resolução de problemas de comunicação complexos
5ª Fase: Criação e Elaboração de símbolos/ideias
6ª Fase: Construção de pontes entre os símbolos/ideias
No final, falei com o orador acerca do passo seguinte, que, nas piolhas já verbais e com o percurso da tal árvore já alcançado, estará no trabalho relativo a outra abordagem terapêutica e que se foca no “pensamento social”. Ele foi incrível e até se ofereceu para me enviar material e informações sobre o trabalho a desenvolver com adolescentes autistas verbais. Não poderia vir embora sem lhe agradecer o facto de esta metodologia ter sido aberta a outros países e ter sido dada a possibilidade de técnicos, terapeutas, professores e pais poderem aprender (claro que ninguém dá nada a ninguém e interessa sempre o fator financeiro, mas ainda, assim, poderia dar-se o caso de ser algo exclusivo e não é bem assim). Eu não tenho qualquer dúvida de que foi esta abordagem lúdica que permitiu chegarmos ao nível de comunicação a que chegámos. Como já escrevi antes, a oralidade nunca foi posta de lado e, a par e passo com gestos, Makaton e PECs, isso permitiu-nos ir alcançando círculo através de círculo. As piolhas tinham imenso vocabulário, tinham a capacidade de o aplicar mas não o faziam, não tinham funcionalidade, não tinham linguagem espontânea e expressiva. É por isto que eu prezo e valorizo tanto a terapia da fala. Independentemente da vocalização, dos sons, as piolhas não eram verbais, não falavam, só produziam ecolália pontual e não funcional. Esta abordagem resultou. E não há palavras que descrevam o que sentimos, o alívio que desce sobre nós, quando, durante anos de incertezas, nos apercebemos que tomámos sempre a decisão certa, estivemos sempre com as pessoas certas do nosso lado, que fizemos bem em seguir este caminho, mesmo sem garantias. Saí daquele auditório feliz e leve. E até me atrevi a dar um abraço ao orador!
A terapia da fala é muito mais do que corrigir dicção ou ensino correto da articulação de sons. Quando há algum tipo de perturbação ou comprometimento ao nível da fala – muito comum e um dos sinais mais característicos do autismo -, importa intervir precocemente e preparar a criança, tanto quanto possível, para que se adquiram competências e pré-requisitos para que os sons da fala, mais tarde, possam ser transformados, digamos assim, em palavras para ler e escrever. A terapia da fala é todo um processo que envolve toda a área da comunicação: verbal, linguística, corporal. Comunicação num todo. O grande objetivo é alcançar uma comunicação efetiva, espontânea, natural. Quantas vezes estivemos em sala de snoezelen ou em piscinas de bolas apenas a “brincar” quando, na realidade, estávamos a treinar as trocas de turnos, foco de atenção, compreensão de instruções e sei lá o que mais…

Agora, como disse, estamos noutro patamar. Não implica menos trabalho ou um respirar de alívio; é, somente, um outro nível. E, com esse novo nível, uma abordagem adequada e adaptada e mais materiais para estudar.
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