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Já há algum tempo que não escrevia sobre coisas sérias. Vamos lá a isso.
Tema: RTP - ou, para leigos, Relatório Técnico-Pedagógico
Ou seja, é o documento que fundamenta a mobilização de medidas seletivas e ou adicionais de suporte à aprendizagem e à inclusão. Deve conter:
a) A identificação dos fatores que facilitam e que dificultam o progresso e o desenvolvimento das aprendizagens do aluno, nomeadamente fatores da escola, do contexto e individuais do aluno;
b) As medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão a mobilizar;
c) O modo de operacionalização de cada medida, incluindo objetivos, metas e indicadores de resultados;
d) Os responsáveis pela implementação das medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão;
e) Os procedimentos de avaliação da eficácia de cada medida e, quando existente, do programa educativo
individual;
f) A articulação com os recursos específicos de apoio à inclusão definidos no artigo 11.º.
A equipa multidisciplinar deve ouvir os pais ou encarregados de educação durante a elaboração do relatório
técnico-pedagógico. O relatório técnico-pedagógico é parte integrante do processo individual do aluno, sem prejuízo da
confidencialidade a que está sujeito nos termos da lei. E deve estar pronto no espaço de 30 (trinta) dias.
Fonte: DL 54 de julho de 2018
Nestes últimos meses, apesar da minha aparente distância, tenho estado atenta. Lamentavelmente, em relação a este assunto, a ignorância ainda é grande - e grave.
Infelizmente, ainda há escolas que, mediante todas as provas irrefutáveis de necessidade de formulação de RTP e referenciação de um aluno - independentemente da sua idade ou ano de escolaridade - ainda resistem à sua elaboração. E/ou aplicação de medidas. Algumas recusam mesmo a elaboração no momento da necessidade porque ratio "alunos com necessidades específicas vs DL 54 vs RTP vs medidas" e eu fico logo ceguinha de raiva e a arder de frustração e rancor e com vontade de correr tudo à chapada porque, quem é que no seu juízo perfeito quer ter um filho a necessitar destes instrumentos e por que há de a escola complicar ainda mais a vida destes alunos (e consequentemente dos seus pais).
Infelizmente também, ainda noto a resistência de alguns pais em assumir que o(s) seu(s) filho(s) precisam de suportes diferentes e que isso não indica nem os torna - de todo! - menos capazes de aprender ou de prosseguir estudos; bem pelo contrário! É um documento que não é estanque, não é permanente, não é definitivo, não é comprometedor - é uma ferramenta de sinalização de que é premente acionar estes e/ou este mecanismo e ter este e/ou este recurso (material ou humano).
Ok, vamos fazer aqui uma pequena, simples e singela comparação: problemas de visão e medidas de suporte. Posso ser aluna, trabalhadora, criança, jovem ou idosa, homem ou mulher (não me venham cá com as cenas dos géneros que para este assunto o que importa é mesmo a dicotomia maculino/feminino). Não vejo bem. Então, vamos criar adaptações, ainda que intuitivas: usar uma lupa para ver as letras pequenas ou fazer zoom no telemóvel, sentar-me mais próximo do que quero ver, afastar/aproximar a imagem/texto para ler melhor, ler sempre o que escrevem no quadro para eu seguir, aumentar a letra no computador ou no telemóvel, piscar os olhos, esfregar os olhos, pedir a alguém para me ler ou descrever o que quero saber, não ler livros em versão papel, etc. Mas, o que NÃO posso fazer porque não mo permitem é usar óculos ou lentes para ver melhor. Porquê? Porque são caros, porque é preciso ter uma receita, porque mais de x% da população já vê mal e isso é uma vergonha para as estatísticas, porque temos de culpar alguém por esse problema e não sabemos quem, porque não quero reunir com ninguém, porque não aceito um relatório do médico, porque a minha mãe não quer, porque eu acho que vejo mesmo muito bem, porque dá trabalho, porque não. Por isso, não posso usar óculos nem lentes e vou continuar a ver mal e a fazer as adaptações mínimas universais quando, na realidade, eu preciso é das seletivas mas nem a minha escola/trabalho nem os meus pais assumem esta necessidade e, por isso, vou sendo empurrada pelo sistema, vou ser prejudicada na minha avaliação e vou ficar aquém das minhas competências por algo que não é culpa minha e que ninguém parece importar-se em minimizar.
Claro que é uma comparação quase idiota e anedótica mas é um pouco o que se passa ainda em Portugal. A deficiência esconde-se, ainda; a deficiência é termo de insulto, ainda; a deficiência dá trabalho, que chatice; a escola já tem mais que fazer do que ainda ter que aturar estes alunos que, ainda por cima, não vão ficar bonitos nos rankings; a escola é para as médias não é para a inclusão. Azeda? Talvez. Revoltada? Sim, ainda. Podemos mudar? Claro que sim! Basta querer! E quem quer?
Fica a pergunta. Agora cada um agirá de acordo com a sua ética e consciência. Individualmente ou em grupo.
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Talvez seja sonho, talvez seja ilusão - talvez seja, apenas, sorte - mas eu ainda acredito numa escola inclusiva.
O que eu entendo por escola inclusiva é aquela que abre as suas portas a todos os alunos, independentemente das suas características, sejam elas físicas, mentais, neurológicas, de nacionalidade, de credo, de status.
É aquela que encontra os recursos humanos e materiais e fornece aos seus alunos as ferramentas para que possam alcançar o sucesso nas suas tarefas - sejam elas escolásticas ou vivências do quotidiano - através de recursos humanos dotados do que necessitam para realizar o seu trabalho (e que, na minha ótica, tem de incluir, obrigatoriamente, empatia, sensibilidade, sentido de adaptabilidade e flexibilidade e uma constante vontade de aprender).
É aquela que para de insistir em cursos da treta só para fazer números e se autopromover à conta de financiamentos de siglas do tamanho de meio alfabeto. É, ao invés, aquela que tenta pensar fora do comum e procura a promoção do sucesso dos seus alunos através de ações bem documentadas, na altura apropriada, e consegue fazer a ponte entre vida escolar obrigatória até aos 18 anos/12º ano e a vida pós-escolar, com a colaboração conjunta de pais-técnicos-médicos-professores para que se tome a decisão mais acertada possível, tendo em consideração as capacidades, dificuldades, autonomia, perspetivas, etc do aluno. Seja ele um aluno com ou sem deficiência.
É aquela onde nos sentimos seguros, motivados e respeitados - os alunos, os pais e os professores - e sentimos que podemos fazer sempre mais, dar sempre mais um pouco de nós.
É aquela que consegue ver para além do óbvio, seja um diagnóstico, seja um rótulo, seja mesmo um processo escolar agregado... sou adepta do start from scratch e de dar sempre uma segunda oportunidade; somos todos diferentes e interagimos de forma diferente com pessoas diferentes.
Pode ser uma utopia mas quero muito acreditar que, algures, é possível e que, pouco a pouco, haja cada vez mais pessoas empenhadas em tornar essa escola uma realidade. Porque, eu sei que é quase possível. Nunca será o pináculo da perfeição mas poderá estar muito próximo do cumprimento legal e básico de direitos humanos - os direitos de todas as crianças.
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Quem passou pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra nos finais dos anos 90 e inícios dos 00s nos cursos de Línguas e Literaturas Modernas com as várias variantes de estudos, apanhou, de certezinha absoluta, aqueles "professores" que guardavam a nota 20 para si mesmos e jamais avaliavam acima do 15, dizendo que este era o seu 20. Eu tive, na realidade, 10s que souberam a 20s, portanto, nada, naquela altura me espantava - a não ser a tremenda injustiça que grassava por lá. Tolerância nenhuma, inclusão pouca... outros tempos, não é verdade?
Por isso, volvidos quase os equivalentes aos anos das bodas de prata, quando algum tenrinho (como, carinhosamente chamo, à geração seguinte - sem ironias, ok?) me diz que adora a faculdade que delira com as aulas, que as notas são maravilhosas, eu, sinceramente, sinto que falamos de outro local.
A minha geração sofreu horrores naquelas salas e corredores. E sim Coimbra, teve mais encanto na hora da despedida. Fiquei muito desiludida, dececionada e magoada com a FLUC. Havia excelentes professores, não duvidemos, mas eram uma percentagem quase mínima... E poucos tinham vagas...
A minha nota mais alta, na FLUC, foi um 15 - o tal equivalente a um 20. Nem queria acreditar que seria possível. Mas chumbei 3 ou 4 vezes, à mesma disciplina, com 9. Sempre com 9. Definitivamente, Psicologia Educacional não era para mim. E chumbar sempre com 9 foi marranço puro da docente para comigo. Quando repeti a disciplina - com outro professor -, terminei com 15, mas adiante.
Consegui, no presente ano letivo, pela primeira vez, na FLUC, uma nota acima dos 15, justa e verdadeira. E sabe muito bem. É coerente, é real.
Tenho feito as pazes com o meu passado naquela instituição. Não tive sorte com a minha década de estudo nem com a escolha de alguns professores (eu ainda sou do tempo das noites dos horários e, estando aquele horário pretendido cheio, lá íamos nós para as opções seguintes... Desgraçado de quem chegasse na 2ª fase. Como eu...). Hoje a FLUC é uma instituição inclusiva, onde estudam pessoas com deficiências visíveis e invisíveis (há vários autistas ingressados num curso superior); adaptada à realidade do dia a dia e não presa num conservadorismo inexplicável; com um gabinete de apoio ao estudante e uma vontade de alargar a experiência universitária a todos. Hoje, a FLUC é a faculdade que eu desejava ter frequentado no final da década de 90; hoje a FLUC é a faculdade com que sonhei em adolescente; hoje é bom estar de volta à FLUC. Hoje, gostaria de apagar aqueles traumas, bullying puro de alguns docentes que já lá não estão (e ainda bem): a vergonha do meu nome ou da minha nacionalidade (eu que sou portuguesa sentia vergonha de não ser tratada da mesma forma que eram os meus colegas estrangeiros), de ter mais aptidão para uma área do que outra, do ser gozada por adorar estar num instituto de volta de livros ou trabalhos, do chorar desalmadamente na casa de banho, do quão difícil era conseguir estar à altura das expectativas de alguns docentes (nunca estava), da humilhação gratuita que nos faziam quando errávamos algo ou não tínhamos o mísero 10 ou de ainda hoje sonhar que me falta fazer uma disciplina para terminar o curso ou pagar a última prestação das propinas. Não me venham cá com mitos de que estudar por lá foi tudo rainbows and butterflies porque não acredito. Cruzei com dezenas de colegas assim. E, quando anos depois, nos encontramos por lá para fazer formação, todos falam disto. Não sou a única...
Hoje, estou feliz por estar na FLUC. Hoje gosto de ser alumni, de ser estudante na Universidade de Coimbra. Hoje sim, sinto-me integrada, incluída, respeitada e ensinada com pedagogia e respeito. Hoje, a FLUC é a "minha" FLUC. E é bom melhorar o passado e vivê-lo com carinho no presente. E eu estou feliz com a minha nota :D
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Uma criança autista será um jovem autista que será um adulto autista. No percurso, poderão estar (ou não) reforços, trabalhos, terapias, acompanhamentos, etc. E um diagnóstico fechado, preferencialmente, escrito preto no branco e, onde, à luz da legislação nacional, se leia “deficiência neurológica”. Ou outra.
Porquê?
Porque, da mesma forma que temos medidas de promoção do sucesso em contexto de aprendizagem escolar que podem ser (e devem, se for caso disso), aplicadas, também temos o seu equivalente no mundo laboral. Para já, ainda não é uma questão sobre a qual eu me debruce muito, mas começo já a ter a noção do que podemos vir a esperar.
Independentemente de haver ou não uma deficiência, há a questão do direito ao trabalho. E do desejo de querer trabalhar. Nada de errado nisso, é até muito louvável, tendo em conta a quantidade de jovens nem-nem (nem estudam nem trabalham) que temos em Portugal. Há, igualmente, a questão do querer ser considerado e tido como igual aos demais na candidatura ou admissão ao lugar a que se concorre. O facto de haver o direito de se considerar uma percentagem obrigatória por lei para pessoas com deficiência – a tal “quota” -, não implica que se usufrua desse direito. Ou, e muita atenção a isto, esteja a ocupar um lugar de outrem. Eu sei que tenho direito a concorrer a nível nacional mas, por opção, não o faço. E, ao fazê-lo ou ao não o fazer, não estou a roubar o lugar a ninguém. Faço-me entender?
Portanto, para que se clarifique um pouco a noção da “quota” ou do trabalhar, mesmo tendo uma deficiência: tal como se faz nas escolas, o que se deve fazer no local de trabalho é ter em conta algumas acomodações para a PcD (Pessoa com Deficiência), por exemplo, uma rampa, um elevador ou um local de trabalho ergonómico ou luzes de baixa intensidade ou uma área reservada para trabalho ou pausas para refeições em cantinas em horários desfasados ou possibilidade de usar abafadores de som ou esquemas visuais etc. Claro que, tal como nas escolas, para que seja mais eficaz tratar desses recursos, é preciso haver um diagnóstico, preto no branco, ou um certificado multiusos que ateste a deficiência. Uma PcD não é incapaz de pertencer ao mundo laboral só porque tem uma deficiência. Mas, precisa – ou pode precisar – de adaptações necessárias para ser tão – ou mais – produtiva que os seus pares (neuro)típicos.
O que considero ser mais justo – utópico, talvez? Espero que não… - é um maior entendimento da questão. Se um autista vai trabalhar e precisa de acomodações necessárias, por que não? Muitas vezes, nem sequer precisa de haver um investimento financeiro, basta alguma boa vontade pois a estruturação, a familiarização com o espaço (e o que é preciso fazer), o estabelecimento de uma rotina ou outros, já serão por conta do funcionário/empregado/colaborador (whatever que está na moda dizer-se agora). Há uma relação estreita entre trabalho-produtividade-ambiente. Ninguém é produtivo num ambiente desajustado. E, sob pena de se perder um excelente profissional, não atentando nesse grande pormenor, perde-se mais do que se ganha.
Deixo apenas uma reflexão em jeitos de conclusão sobre o direito e o desejo do trabalho: o meu professor de LGP é surdo profundo. E é professor e advogado. E ativista. E é um excelente professor e foi graças a ele que temos hoje, na grande maioria dos canais de TV, os intérpretes de LGP no canto da TV, no rodapé. Se concorreu à quotização de trabalhos ou não, não sei nem me interessa. Mas trabalha. E lutou pelas suas acomodações. E é um grande profissional.
É isto que eu quero para as minhas filhas. Porque, podendo ou não usufruir de tal, é um direito que lhes assiste.
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Fiquei sem a minha ferramenta de trabalho mais importante. Não posso substituí-la, nem pedir emprestado, nem arranjar outra. Fruto do tempo ou das -ites e -oses características desta altura, a verdade é que me faz muita falta. E sem ela não posso trabalhar.
Estou sem voz.
Consegui, sabe-se lá como, ter uma faringite vírica e uma laringite bacteriana, tudo num só, o que me deixa aqui as vias aéreas completamente feitas num 8. E escusam de vir as piadolas sem piada nenhuma "agora lá em casa é um sossego" como se lá em casa mais ninguém falasse 😕
Na impossibilidade de falar - e porque tenho indicações médicas para descanso absoluto da voz -, tive de encontrar outras formas de me expressar e comunicar. A quantidade de entraves é fenomenal. Desde usar gestos básicos, a sussurrar, a escrever no bloco de notas do telemóvel, o que notei, de um modo geral, apesar das estratégias diversificadas, foi pressa. Enquanto eu escrevia o que se passava, já tinha passado o momento... O que me levou a questionar várias vezes, ao longo destes dias, o que fará uma pessoa surda (profunda ou não) ou muda para se fazer entender. E como agem os seus interpelados.
Parece que tudo em catadupa: o nome que não é bem lido e sai errado, as indicações clínicas que já vão escritas mas precisam de ser repetidas mais vinte vezes nem sei bem porquê, o fazer a pergunta mas nem dar tempo de responder ou de seguir as indicações médicas, o pressuposto de que se somos professoras devíamos ter alguma especialização em saber como usar a voz sem ter voz, enfim. O que me voltou a despoletar as tais questões "como fará alguém que precise de comunicar efetivamente e não consegue se não dão tempo?". Acredito que se arranjaria uma solução e tudo se resolveria mas, às vezes, temo viver no país dos unicórnios.
Apesar da minha dificuldade em fazer-me entender (as máscaras não ajudam nada para se fazer leitura labial, por exemplo), considero que fui muito bem tratada e cuidada. Eu sei que há muitas queixas e muitos maus serviços mas também sei que há muito bons profissionais e pessoas incansáveis. E eu acredito que, apesar de doente, o nosso SNS ainda vai conseguindo fazer alguns pequenos milagres.
Afinal, as mães e as professoras também ficam doentes e precisam de algo com "poderes especiais" para ajudar. Eu ainda quero acreditar no nosso serviço de saúde. Agora é cuidar destas -ites e -oses.
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Sempre assinalei o dia internacional da deficiência nas escolas por onde fui passando, contando histórias (em português ou em inglês), vendo apresentações ou discutindo ideias com o propósito principal de sensibilizar para a diferença e para a sua aceitação em sociedade.
Os alunos reagem bem a estas propostas e acabamos por descobrir diferenças entre nós, muitas delas invisíveis, e que, mesmo que condicionem as nossas vidas de alguma forma, lutamos para que o seu impacto seja o menor possível e consigamos ser incluídos e aceites como pessoas que somos, antes e acima de tudo.
Nas faixas etárias mais novas, uso sempre dois livros: "Uma lição de amor", da A mãe imperfeita e "Somos todos diferentes" de Emma Datson. Quer um quer outro vou traduzindo para adaptar à minha realidade escolar. No final, fazemos debates ou exercícios.
Para alunos mais velhos, começo por usar um powerpoint sobre as diferenças humanas entre os vários super-heróis do universo Marvel e DC e vou gradualmente trazendo essas diferenças humanas para a vida real, terminando com Fernando Pessoa, Stephen Hawking e Greta Thunberg. Depois, passo um curto vídeo com testemunhos reais, de quem tem sido a minha village nestes anos mais recentes, entre outros: a Tânia (O Mundo do Gonçalinho) e a Marta (Diário de uma pequena guerreira).
No final, depois de falar sucintamente da legislação inclusiva (o DL 54/2018, a Declaração de Salamanca, a própria Constituição da República), há uma breve reflexão privada sobre o assunto abordado.
"We can be heroes" tem sido aquilo que passa em looping na minha cabeça desde que apresentei, há 3 anos, na turma das piolhas, para que todos visse que há diferenças em todos nós, que todos somos divergentes e isso não é certo nem errado.
Não sei como reagirão mas desejo muito e com muita força que algo fique, algo toque nas suas almas e nas suas vidas e a verdadeira inclusão possa ser possível. E todos nós desempenhemos o nosso papel nesse caminho.
(posso partilhar o ppt, é só avisar)
Vídeo em: https://www.facebook.com/t2para4/videos/1073681813463716
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Das muitas publicações que vamos fazendo, já devem ter percebido que eu, a autora A Família Neurodiversa e a autora do O Mundo do Gonçalinho vamos falando e discutindo temas variados. Há pouco tempo, surgiu em conversa a questão da discriminação e aceitação do que é “diferente” - seja ao nível de deficiência, género, cor da pele ou outros. Hoje, vamos as três lançar textos ao longo do dia (um por cada página).
Quando falamos em escola inclusiva e, por acréscimo sociedade inclusiva, a nossa tendência imediata é pensar em deficiência. E ainda bem pois significa que já estamos a chegar a algum lado na consciencialização para a diferença. No entanto, sob a capa da diferença cabem muitas outras coisas, desde etnia, religião, cultura, género, etc. E é de género que falo hoje. Mais especificamente de transgénero.
Vi recentemente um filme que me marcou. Abordava a questão do transgénero há anos atrás, numa altura em que ninguém falava do assunto e em que a marginalização era superior. Era um adolescente que sempre se sentiu diferente no corpo que lhe calhou biologicamente. E, por isso, por se recusar também a fingir ser alguém que não se sentia ser, assumia-se naturalmente. E isso trouxe imensos dissabores pois implicou mudança de escola devido a escalada dos episódios de bullying, mudança de morada por ameaças à sua integridade física, sentimentos muito difíceis de gerir devido ao não querer decionar a mãe mas querer ser o que sentia ser, entre outros.
Nos meus tempos de estudante, tive alguns colegas assim. Eram chamados de muitas coisas, sendo “exuberante” o mais simpático. As histórias que tentavam justificar os seus comportamentos eram do mais rocambolesco que se imagine. A escola não foi totalmente inclusiva para estes alunos. Quantas vezes foram vítimas de humilhação, de agressões... E eles, tal como os que seguem as regras sociais – seja lá o que isso for -, também têm direito ao seu lugar na sociedade. E liberdade de poderem escolher serem quem querem, serem quem se sentem ser. Por que isso incomoda tanto? Por que temos nós – ou outros – de achar que tal ou tal comportamento, tal ou tal convenção estão certas ou erradas? De novo, por que incomoda tanto que um rapaz queira ser uma rapariga ou vice-versa ou não se identifique com nenhum género?
Costumo dizer que a escola é uma sociedade em miniatura com as suas regras e grupos. Então, é aí que o respeito pela diferença, seja ela qual for, deve começar. As escolhas pessoais, os sentimentos profundos de uma pessoa só a ela lhe dizem respeito. Não temos que opinar sobre isso, em especial se não sabemos do que se trata.
Ostracizar, segregar, discriminar a diferença, seja ela qual for, não é ser-se inclusivo. E se a inclusão é palavra de ordem nos tempos que correm, todos devemos fazer a nossa parte.